História

Quem beber das Águas de Lindóia fará história

Sensíveis caiapós, resilientes Bandeirantes, intrépidos tropeiros, um genial médico italiano, a francesa ganhadora de dois prêmios Nobel, os primeiros na Lua, milhões de turistas.
E agora, você.

Nossa história começa em uma imensa floresta em uma terra-continente que num futuro muito distante se tornou parte do lugar chamado Brasil.

Uma jovem caminha vagarosamente para acompanhar o ritmo de seu pai de idade bastante avançada, doente e com dolorosas feridas na pele.

Ela estava se distanciando da tribo que se deslocava pela mata em busca de alimento, mas a alternativa era impensável: deixar o pai entregue à própria sorte.

A história do homem branco dirá que ambos provavelmente faziam parte da tribo caiapó, mas esse povo se denominava mebêngôkre, "os homens do buraco / lugar d'água".

À beira de um córrego encontram a palhoça que servia de abrigo dos idosos à espera da morte eminente. A sombria última morada.

Corrego cristalino na floresta - Águas de Lindóia - SP

O espetáculo das estrelas nascendo aos poucos no fim do dia não aplacava a dor da tristeza no coração da filha.

Ela sabia que agora só lhe restava orar aos deuses. Pediu ânimo para si e alento para o seu pai.

Na fria e silenciosa madrugada, quando a única voz era a do córrego das águas quentes deslizando pelas pedras de seu leito, surge na espessa bruma a visão de um pajé.

Um mensageiro dos deuses comovidos pelo amor da filha por seu pai.

O pajé disse para se banharem e relaxarem naquele córrego. E para beberem de suas águas cristalinas desde cedo e até a noite, por alguns dias.

A moça rapidamente revigorou a força de seu espírito. O pai, aos poucos, recuperou a vontade de viver. Seus ferimentos haviam desaparecido.

As dores de ambos, a emocional e a física, haviam sido curadas.

Reencontraram a tribo e relataram o milagre do ribeirão das águas quentes.

Esta história contada por pinturas em antigas cerâmicas da tribo caiapó teria ocorrido há muitos séculos.

É o relato mais antigo de que se tem notícia a respeito do poder curativo das fontes do Balneário Municipal de Águas de Lindóia.

Ouro azul no caminho dos Bandeirantes em busca do ouro amarelo

Obra de Henrique Bernardelli - Os Bandeirantes, 1889

Agora você está no final do século 17.

A floresta é a mesma dos caiapós. Imensamente bela e densa.

Um grupo de homens sujos e maltrapilhos corta a facão a trilha que os levará passo a passo até as distantes minas de Goiás.

Os galhos da mata reagem brutalmente, lhes cortando a pele e tirando o sangue que atrairá mosquitos.

No instante em que percebem que será preciso parar, avistam o morro que dali a muitos anos será chamado de Pelado.

É um presente do destino, o sinal de que estão chegando ao local do pouso para descanso junto ao ribeirão das águas quentes, onde correm águas abençoadas para os exaustos e feridos.

Amanhã cedo terão vencido esses infortúnios e, banhados e renovados, seguirão viagem sertão adentro em busca do desejado ouro que fez brilhar os olhos destes Bandeirantes.

Alguns anos mais tarde, outro tipo de viajante, os tropeiros levando seus preciosos mantimentos para distantes rincões do Brasil, fariam sua parada no mesmo ribeirão. E partiriam gratos após descansarem e lavarem os seus ferimentos em suas águas.

Uma carta cruza o Atlântico até Benevento.
Estava escrito: o jovem médico italiano iria revolucionar o termalismo mundial.

O jovem Dr Francisco Tozzi em 1901 - Águas de Lindóia SP

Duzentos anos mais tarde, a mesma floresta, ainda repleta de belezas e obstáculos, conheceria o maior herói desta história.

Essa aventura começou com uma correspondência enviada do Brasil por um pároco, datada de 28 de fevereiro de 1.900, destinada ao médico italiano Dr. Francisco Tozzi, morador de Benevento, na região da Campania, no peito do pé da bota.

Antes de revelar o que dizia a mensagem, um pequeno spoiler: mais antiga do que Roma, Florença e Veneza, a cidade natal de Francisco é a pátria do que mudam os ventos do destino quando esses lhes parecem inapropriados. Benevento, “bons ventos”, foi fundada como Maleventum, “maus ventos”.

Na carta, o padre Carmelo D'Angelo, amigo e conterrâneo de Francisco, o chamava para prestar assistência médica na região em que morava.

Formado em medicina clínica e cirúrgica pela Faculdade de Nápoles, o convite deve ter tido o sabor de um novo e irresistível desafio para quem, tão jovem, antes dos 30 anos, já havia sido Secretário de Saúde de Milão.

Francisco embarcou em um vapor, possivelmente no porto de Genova, para a viagem que na época levava até 40 dias. Veio acompanhado pelo tio, o padre Henrique Tozzi, que teve um papel essencial nesta história.

Imigrantes em vapore para o Brasil

“A terra é fértil na colônia. Há muitas árvores. Aqui um homem que trabalha um mês, alimenta uma família por um ano. A água e o ar são excelentes, como no nosso país”, relatou um imigrante italiano.

A “América”, forma como os imigrantes se referiam tanto ao Brasil quanto aos outros países das Américas do Norte, Central e do Sul, era generosa com os que vinham dispostos a trabalhar duro.

Sem dúvida, esse era o caso de Francisco. Assim que desembarcou passou a clinicar dia e noite, e encontrou tempo para iniciar a construção de um hospital em uma cidade vizinha.

Em 1909, padre Henrique contou ao sobrinho que finalmente havia curado o eczema em sua perna através de banhos nas águas do Morro das Águas Quentes.

Ao ouvir isso, Francisco deve ter se lembrado de algo que aprendeu em seus tempos de estudante de medicina.

O historiador grego Heródoto relatou o uso medicinal da água em 500 a.c. Inspirados pelos gregos, desde o século II a.c. os romanos construíam casas de banhos para tratar dores musculares e outros problemas de saúde. A Itália, que seria formada dois milênios depois, se tornaria referência mundial em termalismo.

Antiga casa de banho romana

As termas eram o centro da vida social romana. Elas reuniam grandes e luxuosas salas para banho. Águas aquecidas em caldeirões eram bombeadas por canos de chumbo até as piscinas. As termas possuiam lojas, bibliotecas, espaços com exposição de obras de arte, academias de ginástica, trilhas para caminhadas e lugares para comer. As termas de Dioclécio, na Roma antiga, tinham 13 hectares e podiam receber até 3 mil banhistas.

“Os banhos tinham horários separados para homens e mulheres e eram liberados para escravos”, conta Katherine Ashenburg, autora do livro "Passando a limpo - O banho da Roma antiga até hoje".

Povos foram placidamente conquistados pelo maior império de seu tempo, ansiando usufruir desse ícone do estilo de vida romano.

Pintura Morro Pelado

Com esse conhecimento milenar e uma invejável sede científica, Francisco Tozzi obteve uma amostra da água do Morro das Águas Quentes, a enviou para análise e comprovou a sua suspeita: ela de fato possuía elevado poder curativo.

Por um presente do destino, as terras onde se localizavam as fontes, o Sítio Poços da Água Quente, foi colocado a venda em hasta pública no mesmo ano de 1.909.

Ele não podia prever na ocasião, mas ao adquirir o Sítio da Água Quente se tornava o pai-fundador de um dos mais formidáveis destinos termais e turísticos do planeta, descrito poeticamente 78 anos depois por sua neta Mirian Tozzi como A Cidade das Águas Azuis, que hoje você e milhões de pessoas no mundo conhecem por Águas de Lindóia.

Mas para que isso acontecesse foi preciso desencadear uma epopeia, que merece virar filme: construir do zero toda estrutura necessária para que as pessoas pudessem se beneficiar de tratamentos termais e fisioterápicos no balneário que Francisco idealizou, as Thermas de Lindoya.

Vista da construção das Thermas de Lindoya - 20 setembro 1924 - Águas de Lindóia SP

De maneira extremamente resumida, isso significou abrir estradas em matas fechadas, sob o olhar curioso das jaguatiricas, para transportar ferramentas, materiais para construção e equipamentos em lombos de mulas por locais de topografia acidentada.

Poupando seus recursos, mas jamais esforços, investiu na produção de energia elétrica e no engarrafamento de água mineral. Proveu a estrutura urbana para alojar e proporcionar conforto à mão-de-obra especializada que formou. Criou hortas, granjas, oficinas, consultório, padaria, frigorífico, farmácia e gabinete dentário. Fazia vinho com as uvas de suas parreiras.

Igreja Nossa Senhora das Graças  P/B - Águas de Lindóia SP Foto João Eduardo Biscuola

Sob o olhar emocionado de seu tio Henrique, lançou a pedra fundamental da Capela Nossa Senhora das Graças, em 1918.

O Dr. Tozzi fez algo invejável e espetacular até mesmo para os olhos dos mais ousados empreendedores de hoje: em curto espaço de tempo viabilizou o surgimento de cinco hotéis para receber pacientes e turistas – Catete, Câmara, Senado, Preferido e Glória.

Francisco Tozzi literalmente construiu uma cidade entre copa de árvores.

Dr Tozzi e suas frutas

Atento aos ensinamentos da natureza, a exemplo dos caiapós, persistente como foram os Bandeirantes e determinado como os tropeiros, Francisco Tozzi superou os galhos em seu caminho com um sorriso.

Ele atendia carinhosamente cada pessoa que o procurava em busca de saúde, mesmo ocupadíssimo entre as árduas tarefas diárias de um pioneiro.

Recebia cientistas de diferentes continentes. Enquanto devorava as suculentas frutas de seu pomar, afirmava com convicção e orgulho que a melhor água mineral para a saúde era a das Thermas de Lindoya.

Você pode ver conhecer o lugar exato onde nasceu o belíssimo sonho das Thermas de Lindoya do Dr. Francisco Tozzi: dê um pulo no Balneário Águas de Lindóia.

Consegue adivinhar quem o construiu?

Thermas de Lindoya foi visitada por Madame Curie, a maior cientista de seu tempo.

Correio Paulistano (SP) - 1920 a 1929 - Águas de Lindóia SP

Madame Curie chegou a São Paulo na sexta-feira 13 do mês de agosto de 1926.

No dia seguinte foi para Thermas de Lindoya acompanhada pela filha e por uma comissão de associações científicas paulistas, onde ficou até domingo. O Dr. Tozzi providenciou um carro especial para a viagem.

A manchete de capa do Correio Paulistano e a gentileza do médico são justificadas por dois feitos de proporções gigantescas.

Além de ter sido a primeira mulher a ganhar o prêmio Nobel, a polonesa Marie Sklodowska Curie era até então a única pessoa a ganhá-lo duas vezes: o Nobel de Física em 1903, e o de Química, em 1911.

Madame Curie foi a responsável pela descoberta dos elementos rádio e polônio, e a primeira a utilizar o termo “radioatividade”. O intuito da viagem foi estudar a radiação, divulgar o seu trabalho e arrecadar fundos para o Instituto do Rádio em Paris.

Madame Curie chegando às Thermas de Lindoya acompanhada do Dr Tozzi

Chegada às Thermas de Lindoya. De costas, com o chapéu na mão, o Dr. Tozzi. À sua esquerda, Madame Curie.


A curiosidade característica aos cientistas despertou em Madame Curie o desejo de conhecer as Thermas de Lindoya, que na época já eram muito comentadas na Europa. Curie visitou as fontes radioativas das Termas de Lindoya, os três hotéis, os pavilhões de banho, os locais de engarrafamento das águas, os salões de emanações e as fontes Santa Filomena e São Roque.

Ao examinar as fontes, Madame Curie confirmou a presença de radioatividade, uma das propriedades benéficas da água das Thermas, hoje Balneário Águas de Lindóia.

A água que Madame Curie bebeu é classificada atualmente como oligometálica, hipossódica, hipotermal, oxigenogasosa e radioativa na fonte.

Madame Curie visitou Themas de Lindoya

“Um pequeno passo para um homem, um grande salto para a humanidade”
E orgulho do tamanho da Lua para Águas de Lindóia.

Exemplar de garrafa enviada à NASA para a Missão Apollo 11 - Águas de Lindóia SP

No dia 20 abril de 1969 um caminhão saiu de Águas de Lindóia transportando uma carga preciosa para a ciência espacial: água mineral acondicionada em 100 garrafas de vidro com tampa de alumínio.

O destino foi o Aeroporto Santos-Dumont, no Rio de Janeiro. De lá a carga seguiu para o Centro Espacial Kennedy, na Flórida, Estados Unidos, aos cuidados da NASA.

O motivo da utilização dessa água hipnotizava o mundo.

Astronauta caminhando na Lua com a Terra ao fundo - Águas de Lindóia SP

Em 20 de julho de 1969, a bordo foguete Saturno V, no Cabo Canaveral, Neil Armstrong, Michael Collins e Edwin Aldrin dariam início à Missão Apollo 11, a primeira a colocar os pés do homem na empoeirada superfície da Lua.

A razão da escolha da água mineral mais famosa do Brasil teria sido a sua baixa acidez, rápido grau de absorção pelo organismo e o elevado poder diurético, segundo o Balneário Águas de Lindóia, que possui a nota-fiscal emitida para transporte das garrafas.

Módulo Lunar Apollo (descida) com indicação do reservatório de água - Águas de Lindóia SP

Módulo lunar de descida do projeto Apollo, com indicação do reservatório de água


Além de servir para o consumo dos astronautas, a água também teria sido usada nas baterias do foguete Saturno 5.

Katherine Brown, responsável pela assessoria de imprensa da NASA, não confirma e nem contesta que a água utilizada na Missão Apollo 11 foi fornecida por Águas de Lindóia:

“Células de combustível a bordo da espaçonave Apollo forneceram água potável para a tripulação. É possível que a tripulação tenha bebido água engarrafada após o voo, mas não temos nenhum registro sobre a origem das garrafas”.

Alguém acredita que a NASA não mantém registros sobre a origem da água que foi utilizada em sua missão espacial de maior impacto na história?

Muitos detalhes envolvendo a corrida espacial entre norte-americanos e russos permanecem sob sigilo.